Inês Mapurunga
Desta vez vou escrever-vos sobre um livro, que tem três discos de canções, loas de Maracatus, Afoxés, Coroações, Rezas e outros Batuques, e ainda escreverei sobre comida! Edição de luxo apetece dizer que são três discos com um livro que os explica, em particular o seu conteúdo, e integrados em manifestações culturais afro-brasileiras.
A autora /cantora é uma personalidade bem conhecida, e multifacetada, nestas áreas. No prefácio do Professor Gilmar de Carvalho pode ler-se que Inês Mapurunga é cantora, compositora, pesquisadora e produtora cultural tendo feito parceria com o artista plástico carnavalesco e brincante e mestre de Maracatu Descartes Gadelha para nos dar este presente. Tive a sorte e o prazer de conhecer ambos em anos anteriores e poder apreciar as suas artes. O livro é ainda enriquecido com reprodução de pinturas de Cantídio Brasil, e ilustrações de Descartes Gadelha.
Inês Mapurunga em palco
Para além do prefácio, que defense a presença da cultura negra na região do Ceará e afirma a pertença destas artes no património cultural regional. Depois ainda textos da autora com os títulos Nossos Batuques, O Maracatu do Ceará, Estética do Maracatu, Personagens do maracatu, A Mulher no Maracatu, e Estética Rítmica Musical que colocam este livro como uma fonte obrigatória para quem queira saber sobre Maracatus.
Apresenta um sumário com todas as Loas, toadas e Rezas dos Maracatus, Afoxés e outros Batuques, e ainda uma lista das Loas e Toadas por temas (Religiosidade, Diáspora Negra, Homenagem à Rainha, Comida, Mestiçagem, Folclore, Cantiga de Ninar, Amor, Abolicionismo, Festa, Guerreira, História do Maracatu e Praieira). Para cada faixa dos discos temos um texto sobre o tema, os autores e o evento em que foi apresentado. Portanto, para além o seu conteúdo, um livro com todas as informações e detalhes de cada obra.
Final do espetáculo
O livro e discos foram apresentados num grande espetáculo no Cineteatro São Luis em Fortaleza. A autora cantou vinte e duas loas e sempre acompanhada por uma vintena de presenças em palco com batuque sob a batuta de Mestre Descartes Gadelha, que recebeu do público uma grande ovação de palmas em pé, e coro. No grupo de cordas a presença emotiva da filha de autora, Marina Mapurunga, com viola de arco. Vários convidados subiram ao palco para cantar com Inês.
Curiosamente Inês Mapurunga entoou duas loas cujo tema abordava a comida. Não resisto a reproduzir as letras e no final uma breve explicação de cada produto ou receita.
“Sabor Carinhoso do nosso Falar”
(Carnaval 2012 – Maracatu Nação Baobab)
Autoria: Inês Mapurunga e Descartes Gadelha
ÔÔÔ
Boca Cheia d’ Água
ÔÔÔ
É a Riqueza da Fala
Que Cheiro Gostoso
Vindo da Cozinha
Panela no Fogo
Feijão Com Farinha
Negra Temperando
Com o Seu Cantar
Foi Assim que o Brasil
Aprendeu a Falar
Baobab… Vem Pra Mesa IÔIÔ
Baobab… Vem Pra Mesa IÂIÂ
Baobab…Também Chegue Sinhô
Baobab… Também Chegue Sinhá
Baobab… O Cheiro Pelo Mundo
Da Comida dos Orixás
Caruru, Maxixada, Xinxim
Paçocada, Cocada, Dindim
Cuzcuz, Abará e Alfinim
Acaçá, Feijoada e Cumim
Tempero Africano
No Alguidá
Sabor Carinhoso
Do nosso Falar
“A Riqueza da Cozinha É a Riqueza da Fala”
(Carnaval 2006 – Maracatu Kizomba)
Autoria: Inês Mapurunga e Descartes Gadelha
Sou Preta Africana
Nascida no Chão de Luanda
Vim Para Trabalhar
No Corte Pesado da Cana
Mexendo Angu e Abará
Caruru de Ebó
Ensinei este Povo o Falar
O Cheiro Tá no Mundo
Tem Boca Cheia d’ Água
A Riqueza da Cozinha
É a Riqueza da Fala
É Abará, Acarajé, Vatapá
É Caruru, Anguzô, Aluá
É Xuxu, Angu, Mugunzá
É Malagueta, Maxixe e Fubá
Sinhô, Sinhô
Xodó de Sinhá
IOIÔ, IOIÔ
Xodó de IAIÁ
Na Beira do Fogo
Kizomba Traz o nosso Falar
Léxico de termos culinários menos conhecidos:
Abará – puré de feijão-frade sem pele, depois coze em folha de bananeira
Acaçá – bolo de arroz ou milho moído em pedra e cozido em forma de gelatina consistente e envolto em folha de bananeira
Acarajé – bolinhos de puré de feijão-frade, molho de pimenta, cebola e fritos em óleo de dendê
Aluá – bebida fermentada de abacaxi ou milho e com açúcar
Angu – massa mole de fubá de milho ou farinha de mandioca deito em água e sal, ou leite, ou caldo de peixe ou carne
Anguzô – termo de Pernambuco para esparregado de ervas
Caruru – esparregado de bredos
Cocada – doce de coco com açúcar e depois cortado em quadrados
Dindim – creme doce de coco ralado
Ebó - farinha de milho branco, sem sal, depois de cozida junta-se óleo de dendê; junta-se milho com feijão -frade torrado e com água vai ferver, e depois junta-se sal e óleo de dendê
Fubá – farinha fina de arroz ou milho
Maxixada – prato com maxixe
Maxixe – fruto de forma ovalada e casaca verde com espinhos moles
Mugunzá – papa feita de milho descascado, leite de coco ou de vaca, açúcar, manteiga e canela
Paçocada – mistura de carne de sol desfiada e farinha de mandioca
Vatapá – peixe envolto numa papa de farinha de mandioca com molho de dendê e pimenta
Xinxim – guisado de galinha refogada em óleo de dendê e depois juntam-se amendoim, castanha de caju, gengibre, pimenta,
camarão seco, leite de coco e coentro. Da Bahia
Livro / discos a não perder.
*Ilustrações da crónica, de Descartes Gadelha
© Virgílio Nogueiro Gomes
Título: Maracatus, Afoxés, Rezas e outros Batuques
Autora: Inês Mapurunga
ISBN: 978-85-420-0898-2
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