Há muito que desejava conhecer Arouca, seduzido pelas curiosas descrições sobre as misteriosas pedras parideiras, a frecha da Mizarela e os Passadiços do Paiva. Mas Arouca tem mais. Fiquei deveras surpreendido com a grandeza do seu faustoso mosteiro onde se recolhiam, durante séculos, as ricaças das famílias nobres mediante dotes só acessíveis para quem tinha posses. Foi efetuada uma magnífica visita guiada. Um parêntesis para referir que as digressões culturais acompanhadas de explicações por cicerone entendido, são duplamente rendíveis pois o visitante é desperto para observar conteúdos que, de outra forma, passariam completamente desapercebidos. Entre muitos detalhes interessantes, cuja descrição não se enquadra neste escrito, mencionamos a visita ao salão denominado Cadeiral. Ficámos então a saber que as 104 artísticas cadeiras que o compõem foram, todas elas, feitas de madeira de jacarandá. Era nesse salão luxuoso que as mais ilustres servas do Senhor assentavam os seus traseiros para orar ou resolver os assuntos religiosos e administrativos que ao Convento diziam respeito. Então, a admiração que já nutríamos por essa bela árvore, oriunda do Brasil, cresceu ainda mais o que nos levou a redigir crónica específica dedicada a este singular “irmão” do reino vegetal.Como é sabido, os jacarandás floridos que vemos a alegrar jardins, praças e arruamentos das nossas urbes são indubitavelmente das mais belas árvores ornamentais que existem e constituem deleite para poetas, pintores e fotógrafos. Atrevo-me a afirmar que, só por isso, o jacarandá deveria ser considerado uma espécie medicinal porque o sofredor, só de o olhar, fica mais predisposto ao alívio dos seus achaques.Refiro-me concretamente ao Jacaranda mimosifolia que pertence à família botânica das Bignoniaceae e é nativo das regiões tropicais e subtropicais do continente americano. A designação “jacaranda” provém do idioma guarani e significa que a espécie é perfumada. Parece que o termo foi adotado e divulgado pelos portugueses, via Brasil. Por sua vez, “mimosifolia” é palavra latina originada pela similitude das suas folhas com as da acácia mimosa.A árvore, de grande porte e resistência, chega a atingir 30 m de altura e o tronco pode ter 70 cm de diâmetro. As folhas são caducas, opostas e formadas por folíolos que fazem lembrar as mimosas e os fetos. Mas “as jóias da coroa” são as suas vistosas flores dispostas em panículas terminais de azul violáceo. Elas são persistentes, ficando um ror de tempo na árvore. Pode haver duas florações em cada ano, sendo, no entanto, mais espetacular, a que brota na primavera. O fruto é uma cápsula lenhosa e achatada, de 5 a 7 cm de diâmetro, em forma de castanhola. Em contrapartida, as sementes aladas são minúsculas. A copa não é uniforme podendo ter várias configurações.O jacarandá reproduz-se por sementes que, depois de demolhadas, são dispostas em solo bem drenado de pH neutro. Muito dificilmente se consegue a reprodução por estacaria. Tolera períodos de seca mas não gosta de geadas nem da salinidade. A folhagem é adequada para resistir e minimizar a poluição urbana, mas não a industrial.A madeira é aromática, sendo muito apreciada para a confeção de mobiliário e laminados. Na América Latina usa-se a decocção das folhas como mezinha antisséptica e antibacteriana.Hoje, o principal uso do jacarandá é notoriamente o de ornamentar cidades de climas tropicais e temperados em todo o mundo. Em combinação com a tipuana (outra bela árvores exótica), quando ambas estão floridas, o efeito, de ouro sobre azul, é espetacular.Voltando ao cadeiral do Mosteiro de Arouca, uma dúvida surgiu. A madeira utilizada seria proveniente da espécie mimosifolia, ou viria de outra espécie de jacarandá? Concretamente do Jacaranda copaia cujo tronco é mais direito e pode atingir 45 m de altura? Creio que essa variedade, por ser mais exigente climaticamente, não é cultivada em Portugal.Mas subsiste ainda outra questão. Não seria a tal madeira proveniente do Jacarandá-da Bahia, como é conhecida no Brasil a Dalbergia nigra, árvore da família das Fabaceae que os anglófonos apelidam de Brazilian Rosewood? Ela é impropriamente chamada de jacarandá mas fornece uma madeira muito cobiçada pela sua textura, coloração, elasticidade e durabilidade. Perante tais dúvidas, peço humildemente aos especialistas que esclareçam afinal de que jacarandá foi feito o artístico cadeiral do Mosteiro de Arouca e quiçá o rico mobiliário de outros mosteiros, conventos e igrejas dos séculos XVIII e XIX os quais cultuam a divindade por esse País fora. Aguardo pacientemente!
Miguel Boieiro
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