Na viagem realizada em fins de agosto pelo sul da Itália, tive o prazer de conhecer a “melanzana rossa”. Foi em Matera, cidade mística e mítica que em 2019 irá ser a Cidade Europeia da Cultura. Entre tantas surpresas agradáveis proporcionadas pela participação no 84º Congresso Italiano de Esperanto, com realce para as excursões efetuadas na região da Basilicata onde visitámos palácios, museus e igrejas, destacámos a que foi feita à cidade pétrea, dotada de cavernas ancestrais. Recordar tudo o que aí se viu é sumamente difícil, mas recordo que mesmo no fim da digressão, entrámos numa loja “gourmet” onde um fruto vermelho e arredondado passou de mão em mão, sem ninguém adivinhar o que seria. Parecia uma maçã ou um tomate mas era simplesmente uma beringela, que dá pelo nome vernáculo de Solanum aethiopicum, especialidade daquela região.
Esta foi uma das maneiras de iniciar a presente croniqueta. Outra poderia ser a relativa à experiência que tive quando fiz os “Berberes do Toubkal”, integrado numa caravana de caminheiros que, em 8 dias, percorreu 140 quilómetros nas montanhas do Atlas. O jovem guia era berbere mas expressava-se em bom francês. Ao comentar os ingredientes do almoço esqueci-me do termo “aubergine” e escapou-me “beringela”. Não houve problema pois o guia de imediato entendeu. Afinal a palavra portuguesa era igual à do seu idioma. Mas chega de conversa fiada!
A beringela, cujo nome científico é Solanum melongena, pertence à família das Solanaceae e ao contrário de outras solanáceas conhecidas, como o tomate, a batata e o pimento, não proveio das américas. É originária da Índia e entrou na Europa trazida pelos árabes no século XIII. Os europeus, a princípio, olharam-na com desconfiança. Como se sabe, todas as solanáceas possuem elementos tóxicos e algumas são mesmo mortais. Os italianos chamaram-lhe “melanzana” que significa maçã malquista, mas pouco a pouco, após muitas hibridações, das centenas de variedades espontâneas, logrou-se alcançar espécies comestíveis com baixo teor em solanina e solasonina (as tais substâncias tóxicas) e o consumo da beringela como alimento, popularizou-se.
A planta possui caule ereto, ramificado e peludo podendo atingir 1 metro de altura. As folhas, oblongas ou ovadas, são ásperas. As flores, hermafroditas, com cinco pétalas brancas ou violáceas, apresentam-se solitárias. Mas o que mais nos interessa são os frutos. Eles são grandes com pele lisa e brilhante podendo ter várias configurações, se bem que as mais frequentes sejam as ovoides ou piriformes. A sua cor pode ser roxa, negra, amarela, branca (nos EUA chamam-lhe “eggplant”) ou até vermelha, como a que vimos na Itália. A polpa tem textura esponjosa.
Os maiores produtores mundiais são a China e a Índia com 85% das quantidades obtidas em todo o mundo. Na Europa, com exceção da Itália e da Espanha, a sua produção e consumo são ainda incipientes. Em Portugal era praticamente desconhecida há meio século. Ainda me lembro bem quando vi beringelas pela primeira vez.
A beringela gosta de calor e luminosidade mas detesta regas abundantes quando está a florir. Possui vitamina C, vitaminas do complexo B, cálcio, ferro, potássio, magnésio e selénio. É rica em fibras solúveis e integra alguns alcaloides.
Embora ainda não suficientemente estudada no tocante aos seus poderes medicinais, atribuem-lhe virtudes como a de ser digestiva, nutritiva, laxante e antioxidante. Reduz as taxas do colesterol e atua nos problemas de artrite, gota, reumatismo e diabetes. Externamente, em cataplasma, atenua os efeitos das queimaduras solares.
No entanto, é na gastronomia que a beringela atinge maior projeção. O seu sabor em refogados, “ratatouilles”, lasanhas, frita, panada ou assada às rodelas, é único, contribuindo para dilatar a paleta de paladares dos vários pratos cozinhados. O “caviar” de beringelas, confecionado com as ditas assadas, tomate, cebola e ervas aromáticas forma uma pasta muito apreciada que substitui com vantagens económicas, e não só, as ovas de esturjão.
A terminar, adverte-se que jamais se deve consumi-la crua, porque o seu gosto é amargo e retém maior índice de alcaloides.
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