Museu de São Roque
Fachada do Museu, tendo em primeiro plano, escultura recente, do Padre António Vieira
Acontecendo uma onda de peste que assolou Lisboa, D. Manuel I, que reinou entre 1495 e 1521, pediu à República de Veneza, em 1505, uma relíquia de São Roque. Já nesse tempo era conhecida a fama milagreira deste santo em relação a enfermidades semelhantes e a relíquia iria permitir uma devoção local na esperança de dizimação da peste. Em 1506 iniciou-se a construção de ermida para receber a relíquia, e poder ser venerada, e a ermida abrir ao culto, numa zonza alta e descampada, fora da muralha fernandina. No adro da ermida foi instalado também o cemitério para sepultar as vítimas da peste. Nesse tempo foi criada uma confraria com a invocação de São Roque, ficando a gerir a ermida garantindo a manutenção do culto e a conservação da ermida.
A imagem de São Roque que nos recebe na entrada do museu, com o detalhe do cão com um pão na boca Portugal, século XVI, Calcário policromado
A convite de D. João III (1521-1557) chega a Lisboa a Companhia de Jesus, 1540, que escolhe a ermida de São Roque e seus terrenos para a construção da sua primeira igreja e casa professa, o que aconteceu em 1565. Foi demolida a ermida e construída a igreja com a dimensão igual e mantiveram a invocação a São Roque, sedo-lhe dedicada a terceira capela do lado direito. Com a expulsão do Jesuítas em 1759, é entregue por D. José I (1750-1777) o conjunto da Igreja e Casa Confessa e seu acervo, à Santa Casa da Misericórdia de Lisboa em 1768. Nas instalações abriu em 1905 o Museu do Tesouro da Capela Real de São João Baptista, tendo sido ampliado e atualmente é o Museu de São Roque.
As 4 Tábuas da Vida e Lenda de São Roque
Os biógrafos de São Roque têm tido em identificar com rigor a data de nascimento e da sua morte. No entanto é comum assumir como 1295 a data do seu nascimento, e a sua morte em 1327 em Montpellier, França. A sua festa litúrgica celebra-se a 16 de agosto dia da sua morte. Sendo filho de uma família abastada e herdeiro de uma elevada fortuna pois os seus pais morreram cedo. Educado por um tio, estudou medicina, mas sentiu desde cedo um chamamento para a pratica da caridade e, após distribuir aos pobres a maioria da sua fortuna, partiu em peregrinação para Roma. Na proximidade de Viterbo deparou-se com uma epidemia da Peste Negra. Dedica-se a apoiar os doentes e consta que os operava com um bisturi e o sinal da cruz. Deste tempo se referem os biógrafos às primeiras curas milagrosas. Continuou a sua peregrinação até Roma e decide regressar a casa e, em Piacenza, descobre que também estava infetado e estranha ninguém o querer ajudar. Isola-se no seio de uma floresta e numa cabana recolheu-se. Diz a lenda que passados dias, o que evitou a sua morte de fome, surge um cão com um pão na boca que lho ofereceu. Este cão passou a visitá-lo diariamente e a trazer-lhe um pão até que o dono do cão se decide a verificar para onde este o levava todos os dias. Foi convertido por São Roque que, entretanto, ficou miraculosamente salvo. De regresso a Montpellier não foi reconhecido. Mais uma dúvida se levanta em relação ao seu destino, constado que terá sido preso e que terá morrido na cadeia. Foi reconhecido pelo sinal de uma cruz que tinha no peito. Posteriormente foi sepultado, em Veneza, em artístico túmulo em Roma na igreja Scuola Grande di San Rocco, e decorado por Tintoretto.
Imagens de parte da encomenda para a capela de S. João Baptista
São Roque é sempre representado vestindo como um peregrino, com uma vara na mão direita, a concha símbolo dos peregrinos de Santiago, mostra na perna esquerda um ferimento da peste, e na proximidade sempre um cão com um pão na boca. Geralmente é reconhecido como protetor dos médicos cirurgiões, peregrinos, farmacêuticos, agricultores, coveiros, gatos-pingados, calceteiros, viajantes, inválidos, pobres e prisioneiros.
Outra imagem do interior do museu
O pão, alimento ainda estruturante na alimentação portuguesa, é um dos símbolos da iconografia de São Roque. Quando entramos no museu uma belíssima imagem de São Roque nos mostra de imediato esse elemento. Depois, quando entramos para a primeira sala deparamo-nos com as Tábuas da Vida e Lenda de São Roque, Jorge Leal / Cristóvão de Utreque (?), c. 1520, nos quais estão representados elementos de alimentação. Vejamos em detalhe:
Nesta pintura 2 representações de comida, na cama uma possível sopa a ser dada à colher, no fundo da cama uma caixa com marmelada (e revigorante da época), e mais um elemento líquido no fogareiro que poderá ser água aquecida para lavar o recém nascido . De notar o sinal em forma de cruz que seria o reconhecimento de São Roque
Nesta pintura, e em mesa baixa aos pés da cama, três elementos que poderiam ser bagos de romã, pote de mel e outro, representando o primeiro grande milagre, a cura de um cardeal cujo símbolo, chapéu cardinalíceo e a capa se encontra aos pés da cama
Parece indissociável um espaço sem outro. Por isso, visite a Igreja e o Museu de São Roque. Há muitos lisboetas, de nascimento ou de residência, que ainda não conhecem. Assumidamente um grande conjunto de arte sacra, local obrigatório de visita.
© Virgílio Nogueiro Gomes